Novos tempos, novos comportamentos entre os colecionadores, novos objetos de desejo. O que mudou nestes 30 anos de ranking da ARTnews?
Os tempos mudaram desde que a ARTnews iniciou sua lista dos Top 200 colecionadores, há 30 anos. Naquela época, as obras de arte que batiam recordes em leilão tendiam a ser pinturas impressionistas e pós-impressionistas. O Retrato do Dr. Gachet, de Vincent van Gogh, que foi vendido por US$ 82,5 milhões em 1990, deteve o recorde de pinturas com preços mais altos em 14 anos, e as pessoas que compravam arte nesta escala vinham de círculos pequenos e rarefeitos.
Globalização e reconhecimento
Com o fim da recessão da década de 1990, o mercado tornou-se dinâmico, com preços recordes e um ritmo acelerado entre o mercado primário (quando as obras são vendidas pela primeira vez) e o mercado secundário (quando as obras mudam de mãos através de vendas privadas ou em leilão ), globalização e, mais recentemente, um crescente interesse na produção de uma gama cada vez mais diversificada de artistas. Os gostos mudaram para elevar os historicamente esquecidos e excluídos, incluindo mulheres e artistas negros.
No passado, se obras de artistas afro-americanos apareciam em leilão, tendiam a ser de jovens artistas e oferecidas em vendas diurnas. Mas nas vendas de novembro de 2018, a Sotheby’s destacou em sua noite de arte contemporânea, em Nova York, a pintura “The Businessmen” (1947), de Jacob Lawrence, vendida por um recorde de US$ 6,2 milhões. Na mesma semana, a Christie’s ofereceu “Lady Day II” (1971), de Sam Gilliam, vendida por um recorde de US$ 2,2 milhões, quase dobrando o recorde anterior do artista – estabelecido apenas alguns meses antes, na Sotheby’s London. Na Sotheby’s New York, em maio passado, 10 dos 63 lotes da venda noturna de arte contemporânea da casa foram de artistas negros.
“Há uma grande mudança no que está acontecendo no colecionismo”, disse Sara Friedlander, chefe de arte contemporânea e pós-guerra de Christie’s. “Colecionadores de todo o mundo estão procurando por algo novo que também seja de grande qualidade – em paralelo ao que está acontecendo na curadoria de museus e galerias”, ampliando de artistas brancos por mulheres e negros.
Democratização da arte
Esses desdobramentos recentes estão ligados a outro: a abertura do mundo da arte em geral. “Havia um nível de inacessibilidade assustador há 30 anos”, disse David Galperin, chefe de vendas da Sotheby’s, à ARTnews. “À medida que as informações se tornam mais rapidamente transmitidas e facilmente acessíveis – e as obras são vendidas de uma maneira radicalmente diferente, você vê um tipo diferente de colecionador emergir em todos os níveis. Você não precisa mais ser um ‘insider’ para ter acesso ao melhor material”.
A ascensão das mídias sociais também ajudou a arte a se popularizar. “É difícil perder o mundo da arte neste momento, seja online, no Instagram ou em uma feira de arte que está chegando a uma cidade perto de você”, disse Jackie Wachter, especialista em arte contemporânea da Sotheby’s. Em Hong Kong, uma porcentagem significativa de compradores ativos é de millennials. De acordo com o mais recente Art Basel e UBS Global Art Market Report, 39% dos colecionadores de Hong Kong se enquadravam nessa demografia, enquanto a Sotheby’s disse que 50% de seus compradores em Hong Kong nesta primavera é de millennials.
Diversificação entre os colecionadores
Além de um alcance mais global, a lista dos 200 melhores colecionadores da ARTnews inclui uma maior diversidade: entre eles estão Pamela J. Joyner e Alfred J. Giuffrida; Raymond J. McGuire e Crystal McCrary; e Kasseem “Swizz Beatz” Dean & Alicia Keys. Todos criaram coleções sérias com foco em artistas negros que estão sendo reconhecidos como importantes em termos culturais e financeiros.
“Este é um momento decisivo, com o reconhecimento há muito esperado desses artistas de importância crítica para o mundo como o conhecemos – e como o conheceremos”, disse McGuire, que foi o primeiro do ranking de 2014, com artistas afro-americanos entre suas preferências. Como ele disse, “o que gostamos de fazer é colecionar artistas vivos, dar-lhes vida e mostrar ao mundo sua missão”.
O que também mudou foi o grande volume de informações e análises disponíveis para os colecionadores. E isso se traduziu em colecionadores à procura de novas oportunidades. “Como os colecionadores estão munidos de mais informações, procuram agora em mercados onde os preços são menos desenvolvidos do que aquilo que tradicionalmente definiríamos como blue-chip, como o expressionismo abstrato ou o pop”, disse Galperin, da Sotheby’s.
Joyner, cuja coleção de arte abstrata afro-americana e arte contemporânea da diáspora africana foi objeto de uma recente exposição itinerante, acredita que a definição está se expandindo para melhor. “Blue-chip é blue-chip”, disse ela. “O que estamos experimentando é simplesmente a remoção dessa barreira artificial que definiu o blue chip como orientado para os homens brancos ocidentais”.
“Nós, nas casas de leilão, somos culpados por estabelecer um sistema onde o maior lance é recompensado”, disse Friedlander. “Não sei se é isso que define um colecionador deste ranking. O mercado está sempre buscando a excelência, e isso nem sempre está atrelado aos preços mais altos. Costumamos julgar como melhores os que obtém preços mais altos. Isso está mudando”.
McGuire concordou. “A mudança está no reconhecimento de artistas muito importantes que não foram incluídos na conversa – cujo resultado é um interesse crescente agora em garantir que as coleções representem todos os artistas importantes, e não apenas alguns selecionados”.
Esse compromisso pode ser benéfico para todos, disse Joyner: “A inclusão de mais narrativas amplia os horizontes”.