Com 80 peças, chega a São Paulo no dia do aniversário da cidade (25 de janeiro) uma retrospectiva do artista Jean-Michel Basquiat
“Eu sei desenhar, mas não quero”, costumava dizer Jean-Michel Basquiat (1960-1988), conhecido por pinturas que lembram grafites e traços robustos que se assemelham a desenhos infantis.
Nos anos 1970, o artista negro começou a ganhar popularidade ao pichar muros em Nova York com a assinatura de “SAMO” (“same old shit”, ou “mesma merda de sempre”) passando depois ao suporte convencional das telas.
“Ele queria ser visto, por isso grafitava em lugares que chamassem a atenção”, diz Pieter Tjabbes, que assina a curadoria da primeira retrospectiva do artista no Brasil.
A mostra, que será aberta na próxima quinta (25) no CCBB, conta com cerca de 80 obras do artista do acervo do israelense Jose Mugrabi.
Considerado o maior colecionador de Basquiat no mundo -embora não revele quantas peças do artista possui, nem o valor pelo qual cedeu as obras ao CCBB – Mugrabi tem ainda em seu acervo peças de Andy Warhol (1928-87).
Segundo o curador da mostra, foi por colecionar trabalhos de Warhol que Mugrabi conheceu Basquiat.
Warhol foi um grande colega de Basquiat e calcula-se que tenham produzido cerca de cem telas juntos.
No CCBB, estarão expostas três telas da dupla. “Eles tinham uma relação muito intensa”, explica o curador, frisando que, no entanto, o cunho não era sexual. “Basquiat gostava de meninas.”
Além de telas, há na exposição desenhos e objetos -caso da porta de um apartamento em que o artista morou com uma namorada e traz escritos como “famous negro athlets” (famosos atletas negros), um aceno crítico de Basquiat ao fato de que, na época, negros só atingiam a fama se fossem jogadores de basquete ou cantores de jazz.
Fora de museus
Calcula-se que mais de 80% dos trabalhos de Basquiat estejam na mão de colecionadores, e não de museus.
Ao morrer precocemente – Basquiat teve overdose de ecstasy e cocaína aos 27 anos – ele tinha produzido, em sete anos, cerca de 2.000 peças.
Os preços das obras do artista subiram exponencialmente após a sua morte, e os museus não conseguiram acompanhar suas vendas.
Além disso, instituições não costumavam comprar obras de iniciantes. “Hoje os museus não têm fundos para comprar mais as obras de Basquiat”, diz o curador.
Por exemplo, em 2017, uma obra do neoexpressionista bateu recorde em vendas de artistas americanos em leilão ao ser arrematada por US$ 110 milhões em Nova York.
Marcus Bastos, professor do departamento de artes plásticas da USP, acredita que a crise econômica dos anos 1970 tenha ajudado na ascensão de Basquiat.
Para Bastos, a crise possibilitou que artistas vivessem em Manhattan, e não na perferia de Nova York, então “uma cidade com clima underground”. Quando a situação econômica melhorou, nos anos 1980, eles estavam bem posicionados e “estouraram”.
‘Operação de guerra’
O Masp cancelou a exposição de Basquiat que pretendia fazer porque ela estava prevista para o mesmo período da retrospectiva do CCBB.
Em novembro, Heitor Martins, presidente do Masp, afirmou à Folha que duas mostras do artista em São Paulo ao mesmo tempo seriam um “mau uso de recursos públicos num país onde eles estão cada vez mais escassos”.
O CCBB foi autorizado a captar, via Lei Rouanet, cerca de R$ 15 milhões para a realização de sua exposição. O curador Pieter Tjabbes enxerga com normalidade o orçamento.
“Para uma exposição que vai para quatro lugares é normal [esse valor]”, explica Tjabbes. A mostra segue para outras três sedes da instituição ao longo de 2018: Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília. “É o mesmo preço no mundo todo.”
“Tudo é mega em exposições deste porte”, diz Tjabbes. “Só o transporte dessas obras é uma ‘operação de guerra’, precisamos fretar um avião”, exemplifica.
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JEAN-MICHEL BASQUIAT
QUANDO a partir desta quinta (25) até 07/04, qua. a dom. das 9h às 21h
ONDE CCBB, r. Alvares Penteado, 112, tel. (11) 3113-3651
QUANTO entrada gratuita