Pintora do século 20, foi pioneira do modernismo americano, reconhecida por suas telas retratando flores, arranha-céus, crânios de animais e paisagens do Novo México.
Georgia O’Keeffe desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento do modernismo americano e o seu relacionamento com os movimentos de vanguarda europeus do início do século XX. Produzindo um corpo substancial de trabalho ao longo de sete décadas, ela procurou capturar a emoção e o poder dos objetos através da abstração do mundo natural. Alfred Stieglitz identificou-a como a primeira mulher americana modernista, cujas pinturas de flores, paisagens estéreis e closes de natureza morta tornaram-se parte da mitologia e iconografia da paisagem artística americana.
O’Keeffe incorporou as técnicas de outros artistas e foi especialmente influenciada por Paul Strand e seu uso de recortes em fotografias; ela foi uma das primeiras artistas a adaptar o método à pintura ao representar closes de objetos americanos que eram altamente detalhados e abstratos. Não seguiu nenhum movimento artístico específico, mas assim como Arthur Dove, experimentou motivos abstratos da natureza. Trabalhou em séries, sintetizando abstração e realismo para produzir obras que enfatizassem as formas primárias da natureza. Enquanto algumas dessas obras são altamente detalhadas, em outras ela tirou o que considerou desnecessário para se concentrar na forma e na cor.
Através da intensa observação da natureza, da experimentação com escala e do uso matizado de linha e cor, a arte de O’Keeffe permaneceu fundamentada na representação, ao mesmo tempo em que pressionava seus limites. Desde a década de 1940 até a década de 1960, em particular, a arte de O’Keeffe estava fora do mainstream, pois era uma das poucas a aderir à representação em um período em que outros exploravam a não representação ou abandonaram a pintura por completo.
Infância e primeiros estudos
Georgia O’Keeffe nasceu perto de Sun Prairie, Wisconsin, em 1887. Bem cedo, foi incentivada pela mãe a estudar arte, tendo aulas de aquarela com uma artista local, Sara Mann. O’Keeffe veio de uma família onde a educação feminina foi enfatizada e teve a sorte de frequentar a Escola do Instituto de Arte de Chicago entre 1905 e 1906, onde estudou com John Vanderpoel. No outono de 1907, O’Keeffe mudou-se para a cidade de Nova York e frequentou aulas na Art Students League, estudando com William Merritt Chase.
A partir de 1908, incapaz de custear estudos adicionais, trabalhou por dois anos como ilustradora comercial e passou sete anos, entre 1911 e 1918, na Virgínia, Texas e Carolina do Sul.
Um prêmio conquistado através de uma de suas naturezas-mortas, “Dead Rabbit with Copper Pot” (1908), permitiu que ela frequentasse a escola de verão da League em Lake George, Nova York. Enquanto estava em Nova York, frequentava exposições na Galeria 291, que pertencia ao fotógrafo Alfred Stieglitz, um dos poucos lugares nos Estados Unidos onde a arte de vanguarda europeia foi exibida. Pela primeira vez, O’Keeffe foi exposta a artistas europeus populares, como Auguste Rodin e Henri Matisse. Ela abandonou a busca da arte como carreira em 1908 por quatro anos, ocupando um emprego em Chicago como artista comercial.
Ela voltou a se concentrar na arte em 1912, depois de participar de uma aula de desenho na escola de verão da Universidade da Virgínia. Seu professor, Alon Bement, tinha um estilo de ensino inovador que foi fortemente influenciado pelo artista Arthur Wesley Dow. Enquanto ensinava na Columbia College (Carolina do Sul) em 1915, O’Keeffe começou a experimentar a teoria da auto-exploração de Dow através da arte. Ela tomou formas naturais, como nuvens e ondas, e começou uma pequena série de desenhos a carvão, simplificando-as em combinações expressivas e abstratas de formas e linhas. Depois de completar esta série, O’Keeffe enviou alguns deles para sua amiga, Anita Pollitzer, uma ex-colega de classe, que levou os desenhos a Alfred Stieglitz em janeiro de 1916.
Período maduro
Reconhecendo seu potencial, Stieglitz começou a se corresponder com O’Keeffe. Sem o conhecimento da artista, ele exibiu dez de seus desenhos na Gallery 291. Ele enviou fotografias dos desenhos em exposição, dando início à relação profissional entre ambos. Enquanto O’Keeffe continuava a dar aulas, retornou a Nova York em 1917 para ver sua primeira exposição individual, organizada por Stieglitz na 291. Durante esse tempo, O’Keeffe e Stieglitz começaram um caso de amor que duraria até morte dele. Em 1918, Stieglitz ofereceu apoio financeiro a O’Keeffe por um ano para que pudesse viver e pintar em Nova York. Ela demitiu-se do cargo de docente e, pela primeira vez, dedicou-se exclusivamente à arte. Stieglitz divorciou-se de sua primeira esposa, casando-se com O’Keeffe em 1924.
Durante a década de 1920, Stieglitz apresentou O’Keeffe a seus amigos e outros artistas – que incluia Marsden Hartley, Arthur Dove, John Marin e Paul Strand. Stieglitz e seu Círculo, como eram chamados, defendiam o modernismo nos Estados Unidos. O’Keeffe foi profundamente influenciada pela fotografia de Strand e pela capacidade da câmera de comportar-se como uma lente de aumento, assim como pelo precisionismo de Charles Sheeler.
Seguindo esses interesses começou a pintar, em grandes formatos, closes de formas da natureza. Neste período, também passou das aquarelas à tinta a óleo.
Além das flores, O’Keeffe representava os arranha-céus de Nova York e outras formas arquitetônicas. Entre 1926 e 1929, O’Keeffe pintou um grupo paisagens da cidade de Nova York. New York Night (1929) transformou os arranha-céus em estruturas padronizadas e brilhantes. Mais características arquitetônicas estão nas pinturas como Lake George Barns (1926) e Ranchos Church, Taos (1929). Esses simples edifícios, ainda mais simplificados em sua pintura, eram a arquitetura popular anônima dos Estados Unidos; nessas formas, O’Keeffe encontrou uma paz que contrastava com o ambiente frenético da cidade. Nesta década, a artista já passou a ser reconhecida como uma das artistas americanas mais importantes da época e sua arte começou a atingir preços altos.
Novo México e novos temas artísticos
O fascínio de O’Keeffe pela paisagem do Novo México começou em 1929, quando foi convidada do famoso patrono das artes, Mabel Dodge Luhan, na fazenda Dodge, perto de Taos. A artista se apaixonou pela paisagem do Novo México e sua terra estéril. A região, com paisagens dramáticas e arquitetura espanhola antiga, vegetação e terreno seco tornaram-se o foco de sua arte. Seus temas eram simples e básicos.
Até as suas histórias de morte no deserto – uma caveira queimada de sol deixada na areia ou fixada em um poste, como em “Cow’s Skull with Red” (1936) – foram preservadas. Ela considerava esses restos brancos como símbolos do deserto, nada mais. Os ossos de animais secos e os crucifixos de madeira da região que aparecem no seu deserto (Black Cross, New Mexico, 1929) eram imaginações perturbadoras.
Em 1945, O’Keeffe comprou uma antiga casa de adobe no Novo México, para onde se mudou depois da morte de seu marido em 1946. A casa serviu como assunto freqüente em pinturas como Black Patio Door (1955) e Patio with Cloud (1956).
Durante as décadas de 1930 e 1940, a popularidade de O’Keeffe continuou a crescer. A artista foi homenageada com duas retrospectivas importantes, a primeira em 1943 no Art Institute of Chicago e a segunda em 1946 no Museu de Arte Moderna, primeira retrospectiva do museu para o trabalho de uma mulher.
Muitas das pinturas de O’Keeffe da década de 1960, padrões em grande formato de nuvens e paisagens vistas do ar, refletiram uma visão romantica da natureza que remanesce seus primeiros temas. Essas grandes pinturas culminaram em um mural de lona de mais de sete metros, Sky above Clouds IV (1965). Suas pinturas da década de 1970 eram representações intensas e poderosas de um galo preto.
Sua busca pela cor ideal, luz, pedras e ossos secos, transformou suas excursões pelo deserto na proximidade pessoal que sentiu com a perfeição ao seu redor. Uma vez, em um fundo do cânion, ela ficou tão absorvida pela visão que recostou sua cabeça e uivou ao céu, aterrorizando seus companheiros próximos que temiam que ela estivesse ferida. “Eu não posso ajudar – é tudo tão lindo”, foi sua resposta.
Últimos anos e morte tardia
Em 1949, três anos após a morte de Stieglitz, O’Keeffe mudou-se em definitivo para o Novo México. Na década de 1950, ela produziu uma série de obras que incluíam as formas arquitetônicas de sua casa em Abiquiu, uma de suas duas propriedades perto de Santa Fe.
O’Keeffe começou a viajar extensivamente, reunindo inspiração para o seu trabalho. Ela recebeu muitas honrarias, incluindo seu ingresso na American Academy of Arts and Letters, além da Medal of Freedom e da National Medal of Arts.
A despeito de sua crescente popularidade nas décadas de 1950 e 1960, uma retrospectiva realizada pelo Whitney Museum of American Art em 1970 reviveu sua carreira e chamou a atenção de uma nova geração de mulheres na era do feminismo.
Apesar da visão prejudicada, O’Keeffe continuou a produzir arte, trabalhando em aquarela, lápis e argila durante a década de 1970. Embora tenha perdido sua visão central aos 84 anos, ela continuou a pintar. Suas últimas pinturas consistem em linhas e formas abstratas simples, que a levaram de volta aos seus desenhos a carvão iniciais.
Legado
Georgia O’Keeffe passou 70 anos produzindo arte e contribuindo para o desenvolvimento do modernismo americano. Ela era um membro de destaque do do criativo Círculo Stieglitz, influenciando os primeiros modernistas americanos. Notável por seu papel de artista feminina pioneira, influenciou fortemente as artistas do movimento feminista, incluindo Judy Chicago e Miriam Shapiro, que enxergavam o imaginário feminino nas pinturas de flores de O’Keeffe. Artista prolífica, produziu mais de 2000 trabalhos ao longo de sua carreira. O Museu Georgia O’Keeffe, em Santa Fé, é o primeiro museu nos Estados Unidos dedicado a uma artista mulher. Seu centro de pesquisa patrocina bolsas significativas para estudiosos da arte americana moderna.
Georgia O’Keeffe morreu em 6 de março de 1986 aos 98 anos.