Carlito Carvalhosa faz sua primeira individual na Galeria Nara Roesler a partir de 30 de agosto, trazendo uma megainstalação concebida especialmente para o espaço da galeria.
A obra consiste na suspensão de antigos postes de luz de madeira atravessando o espaço expositivo, mesclados a peças de vidro espalhadas pelo chão. Em alguns pontos, os troncos cruzam as paredes, que ajudam a sustentá-los no ar; em outros, são as intersecções entre dois ou mais deles que os mantêm no alto.
Na sala principal figuram os grandes artefatos de madeira, acompanhados de copos e lâmpadas fluorescentes, aqui acoplados ao fundo da sala. É como se o chão tivesse sido suspenso para a parede. Esse espaço expositivo inclui ainda cerca de 16 desenhos de pequenas dimensões criados como um “entalhe” na tinta azul. Na parte dianteira da galeria, a vitrine é tomada pelos copos e lâmpadas, dessa vez no chão e “atravessando” o vidro rumo à rua.
o conceito por trás da obra
Atravessando o cubo branco, os postes – peças inutilizadas de mobiliário urbano – são ressignificadas e ressignificam o local em que se inserem. Trazem para dentro da galeria o universo cotidiano constituído por elementos que são ao mesmo tempo natureza (toras de madeira) e ação humana (postes de luz). Em seu estado de suspensão no ambiente, que conserva e evidencia atos de propósito estético, esses troncos parecem eternizar o movimento pelo qual a cultura evolui do princípio selvagem para a complexidade do conglomerado criado pelo ser humano.
Tudo na instalação leva à percepção da atividade humana. Inclusive sua montagem, que não só mantém nos troncos os antigos anéis de metal da extremidade como também deixa visíveis as grandes porcas e parafusos que prendem as braçadeiras das junções. A matéria parece não sofrer ação da gravidade. A galeria passa então a ser a guardiã da suspensão no tempo e no espaço da natureza convertida em cultura. E nisso se configura seu caráter de arte: na articulação dos dois pólos que constituem o ser humano e na impressão de eternização do transitório.
Os copos e as lâmpadas espalhados pelo chão emprestam uma sensação de fragilidade à aparência da queda iminente, mas encenada de forma estática, como se pudessem se quebrar a qualquer momento. A ação da matéria natural (o tronco de madeira) se sobrepõe à cultura (o vidro trabalhado pelo homem), mostrando a suscetibilidade desta.
Como define o historiador da arte Lorenzo Mammi, “certamente, o paradoxo da imobilidade do transitório não é próprio apenas do trabalho de Carvalhosa, mas de toda a arte, se não de toda forma. Toda formalização é um ato de soberba, natural é desfazer-se. Mas nas obras de Carvalhosa a questão parece adquirir uma inquietude mais intensa, que a torna central. Não há muitos trabalhos de outros artistas em que fique tão evidente que formalizar é estancar uma matéria que escoa, estabelecer um corte horizontal numa descida lenta, mas impossível de se deter para sempre. O trabalho de Carlito Carvalhosa fala da convivência desconfortável de tempo e eternidade.”