Não foi aquele sucesso retumbante alardeado antes do início nem um fracasso de qualquer natureza.
Quando fechar as portas no próximo domingo, com metade do público que pretendeu atrair, a 29ª Bienal de São Paulo terá provado que reverteu o quadro de falência da mostra, visto na edição vazia de dois anos atrás.
Mas não sem tropeços. No lugar de 1 milhão de visitantes, as bilheterias devem encerrar os três meses de exposição com público de 553 mil, mesmo patamar de visitação da 27ª Bienal, em 2006.
Fora isso, foi uma Bienal ofuscada por uma série de polêmicas, desde o início.
Visitantes na 29ª Bienal de Artes de São Paulo: nem cheio, nem vazio
Adriano Vizoni/Folhapress
Logo na abertura, pichadores convidados da mostra atacaram a instalação de Nuno Ramos, que então abrigava três urubus vivos. Ambientalistas e, mais tarde, o Ibama forçaram a retirada das aves, com base em laudo que julgava o pavilhão impróprio para os animais.
Também na abertura da exposição, a curadoria antecipou uma possível repreensão da Justiça Eleitoral e censurou a obra do artista argentino Roberto Jacoby, que fazia campanha pela então candidata Dilma Rousseff.
Desenhos do artista Gil Vicente, em que líderes políticos como Lula e George W. Bush aparecem assassinados, também despertaram a revolta da Ordem dos Advogados do Brasil, que pediu a retirada da obra, ao ver ali uma incitação ao terrorismo.
Mas nada disso parece azedar a avaliação do presidente da Fundação Bienal de São Paulo, Heitor Martins.
“Começamos atrasados, com um prazo bastante curto e um grau de incerteza grande”, lembra Martins em entrevista à Folha. “Conseguimos reverter a trajetória declinante, e o fato de não chegarmos aos números colocados não é uma frustração.”
Eleito há dois anos com a missão de recuperar a imagem da instituição e pôr as contas em ordem, Martins arrebanhou amigos do mercado financeiro para injetar dinheiro na mostra, sanou um rombo de R$ 4 milhões e fez uma edição da Bienal com orçamento de R$ 25 milhões.
“Havia uma série de pendências da edição anterior e uma dívida bancária”, diz Martins. “Agora vamos fechar este ano com um balanço muito limpo, o patrimônio vai ser positivo e vamos ter uma reserva de caixa.”
Também já começou um processo de reforma do pavilhão desenhado por Oscar Niemeyer nos anos 1950.
Chega ao fim agora a primeira etapa da readequação, que consumiu R$ 5 milhões, sendo 80% do valor repassado pelo Ministério da Cultura, para atualizar dispositivos de segurança do prédio.
Martins também trabalha para tornar permanente parte da estrutura usada nessa edição da Bienal, como o projeto educativo. Quase metade do público da mostra, aliás, foi de alunos e professores atendidos pela equipe de educação da exposição.
Enquanto superou expectativas ao treinar 30 mil professores, em vez de esperados 20 mil, não chegou a bater a meta de 350 mil alunos.
“Esse número ficou um pouco aquém”, disse Martins, que culpou a falta de ônibus para o transporte dos estudantes. “A logística se tornou muito desafiadora.”
ESPETÁCULO
Tão desafiadora que parece ter assustado Moacir dos Anjos, um dos curadores-chefes da mostra, ao lado de Agnaldo Farias. À frente de sua primeira exposição desse porte, Dos Anjos disse à Folha que não pretende fazer outra Bienal de São Paulo.
“Foi uma experiência única em dois sentidos, de ser a primeira e a última vez que trabalho nessa escala”, diz o curador. “Não é mais o meu foco nem o modelo que eu quero trabalhar no futuro.”
Dos Anjos falou do paradoxo que é organizar uma exposição gigantesca que não fosse refém do próprio gigantismo e admite que teria feito uma mostra “mais enxuta” se tivesse tempo.
“É como fazer um grande espetáculo sem sucumbir à lógica de espetáculo”, diz. “Não sei qual é a solução.”
Ele também lamenta o fato de a polêmica em torno de algumas obras ter ocupado o centro do debate e ofuscado outros trabalhos. “Isso fez com que pessoas não prestassem atenção a uma série de trabalhos muito importantes, que passaram batidos”, diz Dos Anjos. “Essa polêmica se deu de maneira muito rasa, superficial.”
Inovação da Bienal, os terreiros, pontos de encontro para teatro, cinema e dança espalhados pelo pavilhão, também foram criticados.
Embora Dos Anjos tenha elogiado a ideia de misturar vertentes artísticas, disse que houve uma “vizinhança complicada” com outras obras, por causa do barulho causado pelas atividades.
Fonte: Folha de São Paulo
Matéria de Silas Martí